Coisas que ganhei com a recuperação


É muito fácil para mim, na depressão, me perder em pensamentos sobre tudo o que estou perdendo porque estou me recuperando da anorexia nervosa e do transtorno bipolar. Estou perdendo meu corpo magro. Estou perdendo meu peso baixo. Estou perdendo a admiração de pessoas que queriam ser como eu, perdendo a profusão de palavras, minha extrema criatividade, perdendo minha identidade. É assim que me sinto sobre a coisa toda de recuperação certas vezes e é um assunto frequente nas minhas consultas com toda a minha equipe de tratamento. No entanto, eu costumo ouvir delas duas coisas: 1. O que você sente não necessariamente condiz com a realidade; e 2. Coloque na balança: o que tinha antes, o que você tem agora e qual a importância de cada uma dessas coisas para o que você quer da sua vida.

Hoje, depois de escrever o post anterior, notei algo: neste dia no ano passado, eu considerei tentar me matar porque, depois de meses caindo cada vez mais fundo, minha família ainda não acreditava que eu estivesse doente o suficiente para merecer ajuda. Eu queria morrer porque pensava que não havia como suportar mais. Mas esse também foi o dia em que decidi mudar, fazer algo sozinho. Foi quando eu comecei meu período muito turbulento de tentativa de auto-recuperação. Foi um período traumatizante e vou lembrar para sempre as dores que experimentei, mas também foi minha forma de tentar mudar a minha vida, começar a ir para outra direção, arrumar a bagunça e consertar o que estava dando errado. Exatamente um ano atrás, eu comi meu jantar pela primeira vez em meses como uma forma de provar a mim mesma que eu queria me recuperar, e olhe para como eu estou agora!

Então, hoje eu estou fazendo a coisa de pensar sobre as coisas que eu ganhei com a recuperação. Vou tentar cinco coisas, porque isso será exaustivo o suficiente, mas vamos lá!

1. Eu ganhei um corpo que funciona corretamente
Honestamente, isso pode parecer muito engraçado para alguém que nunca esteve sob controle de um transtorno alimentar, mas você precisa saber o quão precioso é ser capaz de simplesmente fazer cocô naturalmente e sem esforço! Antes, costumava passar até semanas sem fazer isso (havia também um período em que eu costumava contar, porque fiquei realmente preocupada), mas por causa da falta de comida e da falta de água, eu obviamente não fazia cocô e, quando fazia, era doloroso, para dizer o mínimo. No entanto, quando se trata de fazer xixi, eu tive o problema oposto: como meus músculos estavam muito, muito fracos, toda vez que eu bebia um pouco de água, urinava. Eu fiz xixi nas calças várias vezes ao dia. Eu não vou falar muito das outras coisas que mudaram, mas por exemplo, não estar constantemente congelando é outra mudança, e há muitas!

2. Eu ganhei estabilidade emocional
Ok, ainda estou deprimida. Ainda estou ajustando meus remédios e ainda tentando me livrar do desânimo insuportável que tendo a sentir. Porém, em comparação com o resto da minha vida inteira, estou agora, nos últimos dois meses, tremendamente estável. Eu estou passando mais e mais tempo sem me ferir, sem ficar sem comer, sem "queimar pontes" e destruir meus relacionamentos com outras pessoas (ao contrário, estou gradualmente reconstruindo essas relações e reparando os danos que a doença causou às minhas poucas e preciosas amizades antigas, e fazendo novas!). Agora não estou mais fazendo as coisas mais absurdas para tentar "merecer" ganhar atenção, e não sinto que as pessoas têm que constantemente mostrar que me amam, porque não duvido mais disso. Isso, meus amigos, é uma evolução gigantesca!

3. Eu recuperei meu senso de humor e gentileza
A desnutrição por si só afeta o humor e a percepção da realidade grandemente, mas, no meu caso, também piorou meus sintomas bipolares. Eu era, em suma, uma bomba-relógio muito deprimida, mas muito louca, e muito destrutiva. Com a realimentação e medicação adequada, eu lentamente comecei a mudar, a perder o mau humor, parar de perder a paciência por tudo, parei de brigar com minha mãe toda vez que tínhamos qualquer interação, e recuperei a capacidade de fazer comentários espirituosos que fazem as coisas meio engraçadas. Também estou agora mais suave no meu discurso, muito mais gentil quando falo com outras pessoas, o que me faz feliz.

4. Eu recuperei meus hobbies (e ganhei novos)
Com o agravamento da depressão e a obsessão sobre o meu corpo, eu pouco a pouco fui deixando de lado coisas que me faziam feliz. Parei de fazer música, parei de tocar guitarra, parei de ouvir música, parei de assistir a shows de teatro musical, parei de escrever no meu blog de Takarazuka, parei de desenhar, parei tudo. A única coisa que continuei a fazer era escrever, mas não estava escrevendo literatura, apenas coisas que não faziam sentido e não tinham significado além de expressar quão desesperada eu me sentia. Com a recuperação, no começo eu precisava encontrar uma distração para evitar me render aos pensamentos doentes, então comecei a bordar, que era algo que eu sempre quis aprender e nunca levava para frente. Depois, com a melhora da depressão nos últimos meses, voltei a assistir musicais e escrever no blog, voltei a tocar violão, voltei a estudar moda e desenhar.

5. Eu ganhei clareza mental para ajudar outras pessoas
Deixei o melhor para o final. Ajudar pessoas como eu, os "forasteiros", sempre foi meu sonho. Eu sempre quis fazer algo, ser para eles a pessoa que os músicos foram para mim quando eu estava sendo humilhada e não tinha ninguém. Antes, mesmo que eu tentasse o meu melhor para ser útil, ser gentil, ajudar, ser acolhedora, eu estava muito machucada e também perdida eu mesma. Sim, é verdade, continuo muito machucada, mas aos poucos as coisas estão se acertando, aos poucos as feridas vão fechando e, por mais que seja ardido, a cicatrização vai acontecer. E agora posso ver a diferença: posso oferecer conselhos e informações, posso confortar alguém com convicção do que digo. Agora posso escrever um blog que compila coisas e expressa a realidade do que estou vivendo, com a esperança de que outras pessoas passando por isso não se sintam tão sozinhas como eu senti.

Hoje, eu encontrei algo que eu escrevi em 22 de março do ano passado, em uma tentativa de me fazer continuar seguindo em frente apesar de tudo:

Siga através do inferno, mesmo sozinha
Chore quando os olhos queimarem
Durma quando a realidade for escura
Acorde quando pesadelos assombrarem
Mas por favor, não perca a esperança

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