Vegetarianismo e veganismo em transtornos alimentares
Eu sou vegetariana. Antes de começar minha recuperação "oficial" com uma equipe de tratamento, eu automaticamente precisei considerar a possibilidade de ter que quebrar minha dieta vegetariana e comer carne. Eu acreditava que meu vegetarianismo não era influenciado pela anorexia nervosa, e que me tornara vegetariana porque eu cresci no campo, cercada por animais, e comê-los sempre me fez sentir horrível. No entanto, eu estava ciente de que a minha percepção de minhas próprias ações poderia ser influenciada pela doença. Eu pensei "Se me disserem que preciso comer carne, então eu vou ter que fazê-lo". Era um grande medo meu, mas estava determinada a fazer o que a equipe sugerisse.
Quando eu estava sendo entrevistada na triagem, eu disse que era vegetariana. Foi-me perguntado "Por quê?" Mesmo depois que comecei o tratamento, nas primeiras semanas, fui questionada várias vezes por minha nutricionista e terapeuta, mas também por minha endocrinologista e psiquiatra. Eu tive que reafirmar, uma e outra vez, que era porque eu cresci com animais e comê-los me fazia sentir horrível, Mesmo meses mais tarde, especialmente por parte da minha endocrinologista, ainda há certa preocupação com isso, que eu entendo como uma cautela necessária. A razão é a clara relação entre vegetarianismo, veganismo e transtornos alimentares, especialmente a anorexia nervosa e a "ortorexia".
Entre 45% e 54% dos pacientes com anorexia nervosa relatam praticar alguma forma de dieta vegetariana. O problema, então, é individualmente identificar as razões por trás disso e julgar se é ou não motivado pela doença. Existem várias razões para se tornar vegetariano ou vegano, seja por causa dos direitos dos animais, saúde, finanças, religião, dietas para perda de peso ou até mesmo a "tendência" moderna (que se conecta às dietas para perda de peso). Embora a grande maioria dos vegetarianos e veganos tenham aderido à dieta devido a razões éticas, ainda há uma quantidade alarmante de pessoas que aderem a tais dietas a fim de perder peso, influenciadas pela mídia e indústria da moda.
Identificar preocupações, inquietações, ansiedade, relutância, consistência na defesa dos valores éticos e outros fatores mostrará à equipe de tratamento se o paciente precisa ou não ter seu vegetarianismo/veganismo tratado como um sintoma. É importante lembrar que, principalmente em pacientes que restringem sua ingestão, a capacidade de pensar com clareza e tomar decisões baseadas em fatores lógicos e saudáveis está dramaticamente prejudicada. Embora apenas recentemente tenha ocorrido esta nova onda de veganismo, estudos realizados com pessoas doentes, com mais de 25 anos de diferença, mostram que o vegetarianismo não precede os sintomas dos transtornos alimentares na maior parte dos pacientes, ou seja, a mudança para uma dieta vegetariana acontece após o transtorno alimentar começar.
Como uma vegetariana que também sofre de anorexia nervosa, tenho que admitir que, embora o meu vegetarianismo seja motivado por razões éticas, houve momentos em que o usei para mascarar e manter meu distúrbio alimentar, vezes em que o usei para comer menos do que precisava, vezes em que sequer me preocupei em encontrar nutrientes em outro lugar: eu estava simplesmente tirando as carnes do meu prato, sem me preocupar com os nutrientes que eu estava perdendo e, verdade seja dita, sem realmente me preocupar com animal algum, apenas pensando em comer tão pouco quanto possível, É difícil de admitir e me envergonha de mim mesma, mas é a verdade e eu acredito firmemente que, mesmo que suas razões sejam as melhores, se você for vegetariano ou vegano e estiver nos fossos do transtorno alimentar, você vai, de uma forma ou de outra, usar sua ética como uma maneira de comer menos alguma vez.
É por isso que me preocupa ver tantas pessoas em recuperação aderindo às dietas veganas como uma maneira de "curar a relação com a comida". Vejo muito disso no Tumblr e no Instagram. A verdade é que, mais provavelmente, você está fugindo porque parece "seguro" para sua doença. O conceito de "segurança" nos transtornos alimentares é distorcido e difícil de entender se não se está sofrendo com isso, mas tem um forte papel no mantimento de transtornos alimentares. O cérebro doente vai escolher alimentos que são "seguros", seja porque são reconfortantes, porque estão disponíveis em momentos de crise, ou porque têm baixo teor de gordura, açúcar ou qualquer outra coisa que você tema. Recusar-se a comer coisas que não são "seguras" é parte de ter um transtorno alimentar, e é por isso que é tão difícil identificar as verdadeiras razões por trás de uma dieta vegetariana.
Recentemente, tentei me tornar vegana, considerando fazê-lo pelos "motivos certos", mas notei, após algum tempo, que isso estava se tornando uma desculpa para comer menos, porque não tínhamos o suficiente disso ou daquilo em casa (minha família está passando por um momento difícil financeiramente). Além disso, minha condição de saúde fez minha endocrinologista condenar a tentativa: ela disse que eu não poderia fazê-lo agora. Então, eu tive que parar. Por mais que eu me sentisse um fracasso, eu tive que fazer uma escolha: voltar a deixar a doença controlar a mim e às minhas ações e, assim, piorar meu caso, ou confiar em minha equipe e fazer o que disseram. Eu escolhi o último.
Meu conselho seria: se disserem que você precisa, então faça. Confie na sua equipe. Especialmente se disserem que você precisa disso para recuperar seu corpo e fazê-lo funcionar propriamente, se as fontes alternativas de certos nutrientes não forem suficientes para ajudar você em uma emergência, se for uma questão de vida e morte, faça o que dizem. Você tem que se colocar em primeiro lugar antes de salvar o mundo. Você tem que conhecer a si mesmo antes de salvar o mundo. Você tem que ser livre primeiro para que possa libertar o mundo. Se eles dizem que é isso que você precisa fazer, faça. Você terá a chance de fazer suas próprias escolhas quando estiver saudável novamente, quando seu corpo e cérebro estiverem funcionando adequadamente de novo. É difícil, mas não vai durar para sempre. Você pode até usá-lo como uma motivação para trabalhar mais para a recuperação, para que possa salvar animais no futuro. O que você não pode fazer é deixar que isso fique no caminho da sua saúde. Coloque sua saúde em primeiro lugar.
Você escreve tão bem! <3
ResponderExcluirNossa, que absurdo. Muitos médicos não acreditam ou na maioria não sabem o risco enorme que tem de consumir produtos de origem animal, como hoje já é afirmado causadores de doenças graves. Vocês estava prejudicando sua saúde ao fazer isso, e não em ter um dieta vegana. Não existe isso de deixar o mundo pra depois, se você tivesse se importado realmente com alguma questão ética, teria tido a dieta vegana equilibrada, onde realmente comeria e tentaria se curar. Não é nada necessário voltar a fazer uma coisa tão ruim quanto comer animais é por conta de curar a doença. Mas também tem o lado da falta de informações que você provavelmente passou, o que infelizmente ainda acontecesse dentro dos consultórios. Era só ter a dieta vegana de verdade. É afirmado por diversas Associações famosas que esta dieta é nutricionalmente equilibrada da gestação até o último dia de vida, sem exceções.
ResponderExcluirVocê claramente não entendeu o ponto do que eu escrevi. E, apenas para que fique claro, minha nutricionista é vegana e dieta vegetariana é a especialidade dela. O fato é que você, na internet, sem ver meus exames, sem ver meu cotidiano, sem conhecer meu relacionamentos com animais e acreditando que sabe mais do que profissionais de saúde que estudaram no mínimo 7 anos em uma intensa rotina e estão em constante atualização para prestar o serviço que prestam, dificilmente poderia opinar sobre a minha ética ou a minha necessidade de consumo de certos produtos para colocar meu organismo em funcionamento antes que eu pudesse escolher o que fazer de maneira inteiramente consciente.
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